sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Crônica de um sonho - Eça de Queirós - personagens e cenas jurídicas de um homem do Direito

Quantos sonhos não nascem na alma humana com o nascimento de uma criança ?

Quantos destinos, quantos caminhos não são possíveis de serem trilhados ?

E ficam os pais a contemplar os filhos, projetando o futuro dos rebentos, na esperança renovada dos sonhos não alcançados.

Assim olhava, orgulhoso, Manuel Corvelo para o filho recém-nascido, Artur, personagem principal do livro "A Capital", de Eça de Queirós.

O homem, que até então se desolara com a esterilidade de seu casamento, tinha agora em mãos uma semente. Uma "pequena" semente, que se desenvolveria e, fecunda, daria seus frutos no tempo devido. Ia estudar, formar-se, fazer carreira, tornar-se um grande homem. Um homem do Direito - naquela época, como é bem de ver, apenas a advocacia e a medicina podiam significar sucesso na vida. E o futuro começava hoje, por isso "com o seu respeito supersticioso pela magistratura, ainda Artur não fora batizado (...) o bom Manuel Corvelo decidira economizar com método, para mais tarde o levar a Coimbra e fazer dele um bacharel".

O avô fora, no Porto, um tabelião. O pai, estabelecido em Ovar, um escrivão de Direito.

Artur, por fim, haveria de ser Desembargador.

Assim ficava o pai a imaginar-lhe já em sua beca, como um homem célebre, também autor de um livro querido, um amante das Belas-Letras.

"Ele, por esse tempo, coitado, estaria velho: não poderia trabalhar, mas aquele serzinho que, agora, a sonhar lhe mamava no dedo, seria então um filho ilustre e bom, que, pela posição na Magistratura, lhe faria a velhice farta e pela glória nas Letras lhe tornaria o nome clássico".

E o menino crescia mesmo interessado nos livros.

Foi grande a alegria do pai

"quando notou que nada acalmava as raras perrices do Arturzinho, como folhear algum venerável infólio de antiga legislação; e sobretudo, mais tarde, quando viu que o divertimento querido do pequeno, não era rufar em tambores ou cavalgar vassouras, mas, aninhado nas saias da mãe, coser caderninhos de papel, que cobria de capas cor-de-rosa e de que acumulava coleções com a devoção de um velho bibliófilo".

Sinais de inteligência – pensava o pai.

Seguindo o conselho de amigos, que viam o bom desenvolvimento do imberbe, Manuel Corvelo mandou Artur para Coimbra, para os últimos preparatórios de Geometria e Introdução. Dessa forma, ia já se acostumando à beira do rio Mondego e à vida acadêmica. Quando entrasse para a Universidade, entraria como um soldado aguerrido e não como um recruta bisonho.

Mas, como diria Salomão em sua conhecida sabedoria, "a corrida não é dos ligeiros, nem a batalha dos poderosos, nem tampouco são os sábios os que têm alimento, nem tampouco são os entendidos os que têm riquezas (...) porque o tempo e o imprevisto sobrevêm a todos".

E foi justamente isso o que aconteceu : um imprevisto.

Numa das férias escolares de Artur, sua mãe, doente desde o inverno, morreu de uma tísica de garganta. O pai, muito afetado, teve os primeiros sintomas de uma doença de coração que em pouco tempo também o levou à morte. Artur ficou sozinho, cumprindo a descrição do rei – 'sábio sem alimento', 'entendido sem riqueza'.

Os sonhos todos se esvaindo, Coimbra apenas uma miragem.

Diante das necessidades urgentes da vida, não se fez Artur um bacharel em Direito.

Tão pouco um homem das letras. Mesmo indo posteriormente a Lisboa – onde acreditava conseguir inspiração –, não conseguiu concluir nenhuma de suas obras.

E o sonhos viraram fumaça, e toda fumaça é sonho.

Texto retirado do site migalhas.com

"Quem nega um direito não está muito longe de o querer extinguir." Eça de Queirós

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Árvore de Natal na Beira Mar de Florianópolis

O CASO

"Na disputa por quem oferece as maiores atrações natalinas entre as capitais, surge um novo ingrediente. Medição feita por um topógrafo, hoje à tarde, aponta que a árvore de Natal montada na Avenida Beira-Mar Norte não teria os 60 metros anunciados.

Da base ao topo são 39,7 metros. Se for considerado o pararraios, chega a 43 metros. A margem de erro da medição é três metros. Assim, a altura máxima da árvore seria de 46 metros. A medição, claro, foi contratada pelo vereador João Amin (PP), que já contesta na Justiça a forma de contratação das empresas responsáveis pela atração natalina.

O secretário de Turismo João Cavallazzi diz que a medição só confirma a informação oficial dos 60 metros. E faz a conta na ponta do lápis: são 46 metros visíveis mais 17 metros de estacas fincadas no solo para sustentar a estrutura. Total de 63 metros."

A REAÇÃO


Ação pede suspensão de contrato e pagamentos da árvore de Natal na Capital



O Ministério Público de Santa Catarina ajuizou, no dia 9 de dezembro de 2009, ação cautelar inominada preparatória à ação civil pública, requerendo ao Judiciário que determine a suspensão do contrato n° 1056/09, firmado entre a Prefeitura Municipal de Florianópolis e a empresa Palco Sul Eventos Ltda., cujo objeto é a "criação, execução, montagem e desmontagem de Árvore de Natal com aproximadamente 60 metros de altura e estrutura em alumínio, fabricada para suportar em total segurança adversidades climáticas", no valor de R$ 3.700.000,00. A ação, elaborada pelo Promotor de Justiça Newton Henrique Trennepohl, da 31ª Promotoria de Justiça da Capital, com a colaboração do Coordenador-Geral do Centro de Apoio Operacional da Moralidade Administrativa, Promotor de Justiça Ricardo Paladino, também requer a imediata suspensão dos pagamentos pendentes à empresa contratada.
O MPSC apurou, em procedimento que contou com informações técnicas levantadas pelo Centro de Apoio Operacional de Informações e Pesquisas (CIP), irregularidades na dispensa de licitação efetuada pelo Município para contratar a empresa Palco Sul, por esta não ser a única empresa a executar o serviço pretendido e por ser a primeira vez que ela vai executá-lo. Além disso, segundo a apuração, a participação da Palco Sul resumiu-se a intermediar a locação de toda a estrutura, criação, execução, montagem e desmontagem da árvore de Natal, não tendo qualquer participação na sua criação, elaboração, execução e transporte - serviços que foram terceirizados por ela. "Não havia qualquer justificativa para a contratação sem licitação da empresa Palco Sul Ltda., por alegada notória especialização, ou impossibilidade de competição", afirmam os autores da ação.
Segundo a documentação analisada pelo MPSC, a Palco Sul contratou, pelo valor de R$ 896.700,00, a empresa On Projeções para a "locação de sistema eletrônico audiovisual para revestimento de Árvore da Natal, formado por clusters de LED". Pelo valor de R$ 800.000,00, a Palco Sul contratou a empresa Feeling Eventos Ltda. para locação de equipamentos e componentes e para a montagem, operacionalização, desmontagem e retirada dos bens no local onde a árvore seria instalada. "O Município de Florianópolis poderia ter contratado diretamente com a empresa On Projeções, real titular exclusiva do sistema de interatividade audiovisual, e licitado qualquer outro interessado para a montagem da estrutura física da árvore", apontam os Promotores de Justiça.
O Ministério Público também demonstra na ação que a locação e montagem do sistema eletrônico (a cargo da On Projeções), e a locação e montagem do restante da estrutura da árvore, como o "esqueleto" de alumínio, sob a responsabilidade da Feeling Eventos, custaram muito menos do que o valor do contrato firmado pela Prefeitura com a Palco Sul. O custo total da locação e montagem de toda a estrutura da árvore é de R$ 1.696.700,00, enquanto a Palco Sul foi contratada por R$ 3.700.000,00. Além da irregularidade na fundamentação da inexigibilidade da licitação, os Promotores de Justiça demonstram na ação que a terceirização dos serviços também descumpre a Lei de Licitações e o próprio contrato firmado pelo Município.


Redação: Coordenadoria de Comunicação Social do MPSC

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Para que advogados, magistrados e/ou papel?






Justiça self-service

Charge de Gerson Kauer


Por Rafael C. Berthold,
advogado (OAB-RS nº 62.120)

O ano é 2.209 D.C. - ou seja, daqui a duzentos anos - e uma conversa entre avô e neto tem início a partir da seguinte interpelação:

– Vovô, por que o mundo está acabando?

A calma da pergunta revela a inocência da alma infante. E no mesmo tom vem a resposta:

– Porque não existem mais advogados, meu anjo.

– Advogados? Mas o que é isso? O que fazia um advogado?

O velho responde, então, que advogados eram homens e mulheres elegantes que se expressavam sempre de maneira muito culta e que, muitos anos atrás, lutavam pela justiça defendendo as pessoas e a sociedade.

– Eles defendiam as pessoas? Mas eles eram super-heróis?

– Sim. Mas eles não eram vistos assim. Seus próprios clientes muitas vezes não pagavam os seus honorários e ainda faziam piadas, dizendo que as cobras não picavam advogados por ética profissional.

– E como foi que eles desapareceram, vovô?

– Ah, foi tudo parte de um plano secreto e genial, pois todo super-herói tem que enfrentar um supervilão, não é? No caso, para derrotar os advogados esse supervilão se valeu da "União" de três poderes. Por isso chamamos esse supervilão de "União".

Segundo o velho, por meio do primeiro poder, a União permitiu a criação de infinitos cursos de Direito no País inteiro, formando dezenas de milhares de profissionais a cada semestre, o que acabou com a qualidade do ensino e entupiu o mercado de bacharéis.

Com o segundo poder, a União criou leis que permitiam que as pessoas movessem processos judiciais sem a presença de um advogado, favorecendo a defesa de poderosos grupos econômicos e do Estado contra o cidadão leigo e ignorante. Por estarem acostumadas a ouvir piadas sobre como os advogados extorquiam seus clientes, as pessoas aplaudiram a iniciativa.

O terceiro poder foi mais cruel. Seus integrantes fixavam honorários irrisórios para os advogados, mesmo quando a lei estabelecia limite mínimo! Isso sem falar na compensação de honorários.

Mas o terceiro poder não durou muito tempo. Logo depois da criação do processo eletrônico, os computadores se tornaram tão poderosos que aprenderam a julgar os processos sozinhos. Foi o que se denominou de Justiça "self-service". Das decisões não cabiam recursos, já que um computador sempre confirmava a decisão do outro, pois todos obedeciam à mesma lógica.

O primeiro poder, então, absorveu o segundo, com a criação das ´medidas definitivas´, novo nome dado às ´medidas provisórias´ . Só quem poderia fazer alguma coisa eram os advogados, mas já era tarde demais. Estes estavam muito ocupados tentando sobreviver, dirigindo táxis e vendendo cosméticos. Sem advogados, a única forma de restaurar a democracia é por meio das armas.

– E é por isso que o mundo está acabando, meu netinho. Mas agora chega de assuntos tristes. Eu já contei por que as cobras não picam os advogados ?

(*) E.mail: rafael@seb.adv.br



Qualquer grande viagem, começa com o primeiro passo... W. Shakespeare

Por algum tempo venho arquivando alguns textos que considero relevante.
A idéia é continuar arquivando e compartilhar estes textos no mundo virtual.
Os textos terão sempre algum vínculo ao Direito - sejam em relação aos seus princípios, valores morais ou simplesmente em relação a idéia geral deste.
Espero que seja prazeroso a todos.
Vamos lá ;)